Plantas tóxicas

Muitas plantas apresentam, pelo menos em algumas partes, princípios ativos com ação tóxica. No entanto, a simples presença desses princípios em uma planta não a qualifica necessariamente como tóxica. É necessário que haja pelo menos uma referência na literatura de um caso de intoxicação em seres humanos ou animais domésticos motivada por ingestão ou contato com uma planta para que ela seja incluída na lista das espécies tóxicas.
A relação de princípios ativos tóxicos é muito variada, como também o são os mecanismos de sua ação. Muitas vezes, a intoxicação não é causada por substâncias produzidas pela planta, mas por agentes que a infectam, como fungos. Por exemplo, a aflatoxina é produzida por fungos que infectam a torta de amendoim armazenada para servir de ração ao gado bovino. Algumas plantas são tóxicas porque absorvem e acumulam elementos tóxicos do solo, como o selênio. Outras plantas são tóxicas porque desencadeiam processos alérgicos pelo contato da pele com suas folhas.
Assim, é importante conhecer as plantas tóxicas que mais comumente são causa de intoxicações em seres humanos. Vale a pena também acrescentar que nenhuma planta agride o ser humano. Ao contrário, ele é invariavelmente o agente agressor. A planta simplesmente utiliza os recursos que a natureza lhe deu para tentar resistir aos ataques dos quais frequentemente é vítima. Tudo o que devemos fazer é evitar o contato e a ingestão de partes de plantas que podem provocar reações adversas no organismo. Não há também nenhum inconveniente em mantê-las em ambiente doméstico, desde que as pessoas (principalmente as crianças) sejam alertadas para o perigo representado pela ingestão ou manipulação de plantas tóxicas.
Há plantas alimentícias que podem ser ingeridas somente após um tratamento que inative ou elimine os princípios tóxicos. Um exemplo corriqueiro é o feijão, que precisa ser cozido para inativar certas proteínas tóxicas da semente. Por isso, é fundamental esclarecer a população sobre os riscos de intoxicação pelo uso inadequado de algumas plantas comestíveis.
Outro exemplo é a Manihot esculenta, a popular mandioca. Apesar de ser uma planta largamente consumida como fonte calórica, se for preparada inadequadamente, a mandioca causa uma intoxicação que, não raro, se torna fatal. A raiz da mandioca contém uma substância chamada linamarina, que, sob a ação de uma enzima presente nos tecidos da própria raiz, decompõe-se, liberando, entre outras substâncias, o cianidreto. Este é o mesmo gás utilizado em alguns locais dos Estados Unidos para a execução de condenados na câmara de gás.
Certas variedades de mandioca acumulam quantidades muito maiores de linamarina: são as chamadas mandiocas-bravas. Sem análise química, não é possível distinguir as variedades "bravas" das "mansas". A linamarina ocorre em maiores quantidades na casca da raiz, mas a polpa branca comestível contém quantidades consideráveis dessa substância.
Na circulação sanguínea o cianidreto libera o íon cianeto, que é transportado pela hemoglobina. Nas células o cianeto liga-se fortemente ao citocromo mitocondrial, responsável pelo transporte de elétrons na respiração celular. Por essa razão, a pessoa intoxicada passa por um processo de asfixia celular que, dependendo da quantidade de cianeto no sangue, pode provocar a morte.
A maneira mais segura de se preparar a mandioca para a alimentação é eliminar uma boa espessura dos tecidos mais externos sob a casca, deixar as partes descascadas imersas em água por 1 ou 2 horas (o que causa a morte das células e a decomposição da linamarina) e cozinha-las em água fervente por pelo menos 1 hora (para garantir a decomposição do que restou da linamarina).

O que fazer nos casos de intoxicação por plantas
É importante conhecer as principais plantas tóxicas presentes em residências, jardins, locais públicos e arredores, como terrenos baldios. Deve-se assumir como norma rigorosa e geral o aconselhamento das pessoas, principalmente de crianças, para não ingerirem nenhuma parte de plantas, cultivadas ou não, que sejam desconhecidas ou das quais não se tenha absoluta certeza sobre a inocuidade. Também não se devem fazer chás ou outras preparações medicamentosas de plantas a não ser que se tenha certeza de que o uso é seguro. Deve-se combater a noção totalmente infundada, mas infelizmente muito comum, de que "se as plantas não fazem bem, mal também não fazem". Na verdade, na ingestão de partes quaisquer de uma planta desconhecida é muito mais provável a ocorrência de manifestações indesejadas do que a inocuidade.
Finalmente, no caso de uma intoxicação, chame um médico. Tenha à mão um ramo da planta que causou o acidente ou partes dela, mesmo que sejam fragmentos retirados da boca da pessoa intoxicada ou de seu vômito. É possível que o médico desconheça a existência do Centro de Intoxicação local, que muitas vezes é essencial para o tratamento de intoxicações em geral, incluindo as causadas por plantas.

*Antônio Salatino, Prof. Titular do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo.


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