Turismo Rural no Brasil
INTRODUÇÃO
Acordar em uma
fazenda é sem dúvida uma experiência aconchegante, relaxante e acima de tudo
bela. Nada se compara com o clima gostoso que existe no campo. Os passarinhos
são os primeiros a anunciar que uma nova manhã chegou, e juntamente com ela
todo o espetáculo da alvorada. Antes mesmo dos primeiros raios de sol despontar
no céu já se ouve o mugir do gado sendo preparado para a ordenha. Sente-se o
cheiro fascinante de uma broa de fubá assando no forno, e do confortante
cafezinho torrado e moído na própria fazenda sendo coado. Na mesa uma farta
refeição com muito queijo, leite, pão de queijo, bolo de cenoura, goiabada,
sucos e frutas. O desjejum vem acompanhado de uma sinfonia entoada por
bem-te-vis, sabiás e canarinhos da terra.
Hoje a tumultuada
realidade vivida nos aglomerados urbanos, contribuiu para que houvesse uma
baixa considerável da qualidade de vida dos homens. Perdeu-se o ar puro, a
liberdade, o verde, a água. As conquistas adquiridas pelo mundo capitalizado
deixaram escapar o que há de mais prazeroso na vida: a tranquilidade. As
propriedades rurais, fazendas, sítios e chácaras, representam o inverso do
estilo de vida dos grandes centros urbanos. Simbolizam uma forma de existência
que foge do cotidiano das cidades, despertando o interesse de cidadãos comuns
de realizarem um contato profundo com a terra, aproximando-se da natureza e do
ser.
A assimilação do
espaço rural como um local de descanso e lazer proporcionou o surgimento de um
turismo genuíno, diferente dos praticados por grandes massas, promovido em um
ambiente familiar, aconchegante e relaxante. Este turismo tem como enfoque
principal a valorização deste universo rústico, sua memória, culinária,
tradições, promovendo uma interação do homem com o meio ambiente e a
revitalização do espaço.
1. TURISMO RURAL
O Turismo rural é
uma modalidade do turismo que tem por objetivo apresentar como atração as
plantações e culturas em áreas onde as mesmas, porventura, sirvam de referência
internacional no chamado agronegócio.
1.1. Turismo Rural no Brasil
Segundo o documento
do Ministério do Turismo "Diretrizes para o Desenvolvimento do Turismo
Rural", a conceituação de Turismo Rural fundamenta-se em aspectos que se
referem ao turismo, ao território, à base econômica, aos recursos naturais e
culturais e à sociedade.
Com base nesses
aspectos, e nas contribuições dos parceiros de todo o País, define-se Turismo
Rural como: O conjunto de atividades turísticas desenvolvidas no meio rural,
comprometido com a produção agropecuária, agregando valor a produtos e
serviços, resgatando e promovendo o patrimônio cultural e natural da
comunidade.
As atividades
turísticas no meio rural constituem-se da oferta de serviços, equipamentos e
produtos de:
*hospedagem
*alimentação
*recepção à
visitação em propriedades rurais
*recreação,
entretenimento e atividades pedagógicas vinculadas ao contexto rural
*outras atividades
complementares às acima listadas, desde que praticadas no meio rural, que
existam em função do turismo ou que se constituam no motivo da visitação.
A concepção de meio
rural adotada nas Diretrizes brasileiras, baseia-se na noção de território, com
ênfase no critério da destinação e na valorização da ruralidade. Assim,
considera-se território um espaço físico, geograficamente definido, geralmente
contínuo, compreendendo cidades e campos caracterizados por critérios
multidimensionais, como ambiente, economia, sociedade, cultura, política e
instituições, e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que
se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se
pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social,
cultural e territorial.
Nos territórios
rurais, tais elementos manifestam-se, predominantemente, pela destinação da
terra, notadamente focada nas práticas agrícolas, e na noção de ruralidade, ou
seja, no valor que sociedade contemporânea concebe ao rural, e que contempla as
características mais gerais do meio rural: a produção territorializada de
qualidade, a paisagem, a biodiversidade, a cultura e certo modo de vida,
identificadas pela atividade agrícola, a lógica familiar, a cultura
comunitária, a identificação com os ciclos da natureza.
O Comprometimento
com a produção agropecuária identifica-se com a ruralidade: um vínculo com as
coisas da terra. Desta forma, mesmo que as práticas eminentemente agrícolas não
estejam presentes em escala comercial, o comprometimento com a produção
agropecuária pode ser representado pelas práticas sociais e de trabalho, pelo
ambiente, pelos costumes e tradições, pelos aspectos arquitetônicos, pelo
artesanato, pelo modo de vida considerados típicos de cada população rural.
A prestação de
serviços relacionados à hospitalidade em ambiente rural faz com que as
características rurais passem a ser entendidas de outra forma que não apenas
focadas na produção primária de alimentos. Assim, práticas comuns à vida
campesina, como manejo de criações, manifestações culturais e a própria
paisagem passam a ser consideradas importantes componentes do produto turístico
rural e, consequentemente, valorizadas e valoradas por isso.
A agregação de
valor também se faz presente pela possibilidade de verticalização da produção
em pequena escala, ou seja, beneficiamento de produtos in natura,
transformando-os para que possam ser oferecidos ao turista, sob a forma de
conservas, produtos lácteos, refeições e outros.
O Turismo Rural,
além do comprometimento com as atividades agropecuárias, caracteriza-se pela
valorização do patrimônio cultural e natural como elementos da oferta turística
no meio rural. Assim, os empreendedores, na definição de seus produtos de
Turismo Rural, devem contemplar com a maior autenticidade possível os fatores
culturais, por meio do resgate das manifestações e práticas regionais (como o
folclore, os trabalhos manuais, os “causos”, a gastronomia), e primar pela
conservação do ambiente natural.
2. BREVE HISTÓRICO DO TURISMO RURAL
O Brasil tem se destacado mundialmente pelo
seu vasto potencial turístico. Nossa diversidade de ritmos, paisagens, sabores
e culturas têm atraído um número cada vez maior de pessoas interessadas em
desvendar estas particularidades nacionais. Muitas delas estão fortemente
marcadas no berço ou na origem de nossos hábitos e costumes, originados nas
fazendas e nos primeiros povoados. O fato, segundo Adyr Balastreri, professora
doutora do departamento de geografia da universidade de São Paulo, é que está
ocorrendo atualmente uma tendência de valorização da cultura tradicional -
Movimento retrô. Com isto muitas pessoas têm procurado lugares ou costumes que
transcreveram o cotidiano de nossos antepassados.
A história do turismo rural no Brasil é
bastante recente e está relacionada com as diversas fases do processo de
ocupação do território. As paisagens rurais brasileiras, assim como seus
aspectos marcantes, se constituíram através dos chamados ciclos econômicos
originando um diversificado patrimônio histórico e cultural. O ciclo do gado,
que praticamente ocorreu em todo o território nacional, originou grandes rotas
turísticas, um rico folclore e uma saborosa gastronomia. A cana-de-açúcar na
zona da mata nordestina, o ciclo do ouro e do diamante em Minas Gerais e também
a era do café na região sudeste são responsáveis por um valioso patrimônio
arquitetônico urbano e rural.
Hoje muitas sedes de fazendas do autêntico
período colonial têm acolhido várias pessoas interessadas nesta história e
também em participar do cotidiano das atividades rurais. Ao se comparar o
turismo rural com o ecoturismo ou o modelo sol e praia, por exemplo, percebemos
que estamos tratando de uma modalidade nova no Brasil.
2.1. Denominação
Segundo estudiosos,
não existem marcos precisos para datar o início desta atividade, principalmente
em função da dimensão territorial de nosso país. Mas sabe-se também que a
primeira iniciativa oficial, ou seja, com utilização do termo Turismo Rural, se
deu em 1986 na fazenda Pedras Brancas no município de Lages (SC). Oferecendo
pernoite e participação nas atividades típicas do meio rural, esta fazenda
passou a acolher visitantes para usufruir "um dia no campo". Esta
iniciativa se multiplicou ao longo do tempo e rapidamente vários lugares do
território nacional implantaram esta alternativa como incremento ao
desenvolvimento das populações rurais.
3. TERMINOLOGIAS
As terminologias ou
os termos técnicos utilizados no turismo rural são bastante diversificados,
variando inclusive entre países. Segundo a socióloga Graça Joaquim, professora
da escola superior de hotelaria e turismo do Estoril, nos casos da Alemanha,
Holanda, Bélgica, Luxemburgo e França, por exemplo, as áreas rurais, na
perspectiva turística, distinguem-se das cidades, das costas e das montanhas,
estando intimamente ligadas a um povoamento disperso.
Na Itália, embora a
semelhança do conceito, as áreas rurais incluem as zonas de montanha. Na
Espanha, Portugal e na Grécia o espaço rural está fortemente associado ao
espaço agrícola, o que pressupõe uma forte relação do turismo rural com a
agricultura. Dentro desse cenário, apresentamos abaixo algumas denominações
defendidas por Adyr Balastreri, professora doutora do departamento de geografia
da universidade de São Paulo.
3.1. Turismo rural tradicional de origem agrícola
Propriedades que
historicamente se constituíram como unidades de produção agrária durante o ciclo
do café, cujo patrimônio arquitetônico é representado pela sede da fazenda,
áreas de pesque-pague, ordenha de vacas, colheita de frutas, dentre outros.
3.2. Turismo rural tradicional de origem pecuária
São áreas onde a
atividade de criação de gado funcionou como instrumento de apropriação do
território durante o início da colonização e atualmente oferecem infraestrutura
para hospedagem.
3.3. Turismo rural tradicional de colonização europeia
Cuja origem está
relacionada à história da imigração europeia no Brasil, principalmente nas
regiões sul e sudeste do país, onde os estados de Santa Catarina, Rio Grande do
Sul, São Paulo e Espírito Santo se destacam. Algumas fazendas apresentam
instalações luxuosas, cujos proprietários residem ou não na propriedade e a
atividade agrária é ainda importante, sendo o turismo atividade complementar.
3.4. Turismo rural artesanal de origem colonial
Propriedades rurais
tradicionais, com instalações simples nas quais os proprietários residem no
local e cujos meios de subsistência provém das atividades rurais. Vivem do
consórcio das atividades agropecuárias com o turismo, estes desempenhando uma
atividade econômica complementar. Recebem os turistas nas dependências de suas
casas, com eles compartilhando sua moradia. Fazem e vendem produtos artesanais
de origem rural, como compotas, pães, biscoitos e etc. Trata-se de um turismo
de pequeno porte, modesto, de estrutura essencialmente familiar.
3.5. Turismo Rural Contemporâneo
Opõe-se à primeira
categoria por englobar equipamentos implantados mais recentemente, notadamente
a partir dos anos 70, quando o turismo começa a assumir maior significado como
atividade econômica no Brasil. Modalidade alternativa ao turismo "sol e
praia", assumindo importância maior à medida que a população brasileira se
torna mais urbanizada. Como variantes dessa modalidade, destaca-se:
3.6. Agro-turismo
Segundo
classificações europeias, os turistas devem participar das atividades típicas
do campo como força de trabalho, tais como ordenhar uma vaca, colher determinados
frutos e etc.
3.7. Hotéis-fazenda
Hotéis localizados
em zonas rural, implantados deliberadamente para a exploração desse turismo
específico, valorizando a cultura local, como o folclore, a gastronomia, as
atividades típicas tais como cavalgadas e etc.
3.8. Fazendas-hotel
Empreendimentos
localizados em meios rural onde sua construção inicial não foi realizada com o
intuito de atender ao propósito do turismo. Sofreram pequenas adaptações
estruturais visando garantir incremento às atividades econômicas de seus
proprietários com a atividade turística
3.9. Pousadas rurais
De menor porte e
menos luxo, procuram oferecer aos visitantes a possibilidade de usufruir a vida
no campo, sem muita sofisticação.
3.10. Spas rurais
Podem ser enquadrados
também na categoria turismo de saúde, constituindo a versão moderna das antigas
estações termais, hoje com fins estéticos. Situam-se na zona rural com o
intuito de oferecer aos paciente-hóspedes o bucolismo da vida campestre,
associando a ele muitas caminhadas para queimar calorias e produzir o
relaxamento necessário para suportar as dietas.
3.11. Segunda residência campestre
Localizadas na área
rural de municípios vizinhos de grandes centros urbanos, tais como as chácaras
de veraneio, sítios e etc.
3.12. Campings e acampamentos rurais
Já representaram um
meio de hospedagem importante no país e, ainda hoje, apesar de passarem uma
aparente estagnação, são importantes para hospedar jovens e famílias com
crianças, demanda bastante significativa do turismo rural. Localizam-se
geralmente em vales de rios e em áreas de expressiva cobertura vegetal, como as
matas ciliares.
3.13. Turismo de caça e pesca
Modalidade presente
no pantanal mato-grossense, representado pelos ranchos de pesca. Aparecem
também algumas experiências de turismo cinegético, onde a caça é permitida por
lei, sendo os animais criados para este fim.
3.14. Turismo rural místico ou religioso
Modalidade em
crescente expansão em vários pontos do país, notadamente no Brasil Central,
como na Chapada dos Veadeiros, em Goiás. Alguns estabelecimentos estão ligados
à religião, enquanto outros Se caracterizam como centro de vivência
comunitária, vinculados à meditação e práticas místicas. Surgem também
experiências ligadas à tentativa de contato com objetos voadores não identificados
(OVNI's).
3.15. Turismo rural científico-pedagógico
Voltados para a
recepção de alunos e estagiários. É o caso de algumas escolas agrícolas, de
nível médio e superior, que estão abrindo suas portas para visitas e estada
associando turismo, lazer e ensino, traduzindo em experiências muito bem-sucedidas.
3.16. Turismo rural etnográfico
É o caso de
reprodução de aldeias indígenas para receber grupos de estudantes, como, por
exemplo, a aldeia dos Xavantes, em Juquitiba (SP), que foi construída para esse
fim, aproveitando a valorização da cultura indígena promovida pela festa dos
500 anos do descobrimento do Brasil.
É importante
ressaltar que este rol de modalidades não pretende se esgotar dada à rica
experiência do turismo rural no país, assim como sua grande extensão
territorial.
4. O QUE FAZER
As opções de lazer
e entretenimento nos empreendimentos que exploram o turismo no espaço rural são
bastante diversificadas, além de prazerosas. Abaixo, separamos algumas opções
entre gastronomia, passeios e atividades típicas que muito provavelmente irão
influenciar na sua motivação em viajar.
4.1. Aperitivos:
Caninha pura ou misturada com frutas silvestres da região como amora, uva,
araçá, graviola, butiá e tantas outras.
4.2. Tira-gosto:
Torresminho, chouriço, miúdos de galinha e porco, defumados sobre o fogão de
lenha, em especial a linguiça e costelas, queijos, etc., além dos tradicionais
tira-gostos urbanos.
4.3. Café da manhã:
Coalhada, queijo caseiro, pão de queijo, pão integral, bolos, broa de fubá, ovos
quentes ou mexidos, biscoitos, café, leite (se possível tomado no curral),
frutas, mel, muitas vezes com o favo, além dos tradicionais componentes dos
cafés da manhã de hotéis urbanos.
4.4. Almoço:
arroz de carreteiro, canjiquinha, costelas de porco, feijão tropeiro com
torresmo, moranga, abóbora, batata doce, lombo, frango, ovos, couve e uma
variedade de saladas, sendo praticamente todos os produtos naturais da fazenda,
além do velho churrasco temperado com sal grosso ou com tempero de cozimento.
4.5. Sobremesas:
Doces diversos (de leite, de mamão verde, de laranja, carambola, jiló),
rapadura, pudins de leite ou queijo, arroz doce com canela, ambrosia, paçoca,
rosquinha de coalhada, canjica com leite e coco em gemada de ovos.
4.6. Café da Tarde:
Camargo (café torrado em casa bem forte, bem quente adoçado a gosto e o leite
tirado diretamente da caneca do café, deixando-o bem espumoso), rosca de
polvilho e coalhada, bolinho frito com açúcar e canela.
4.7. Passeios
Cada fazenda tem
características próprias, mas em geral oferecem passeios em charrete, cavalo,
pônei, trator, visita ao moinho, engenho, alambique, laticínios, curral,
criação de aves, jipe 4x4, caminhadas ecológicas, passeios em cachoeiras,
córregos e rios, dentre outros.
4.8. Atividades típicas
Ordenha de vaca,
colheita de frutas, verduras, mel de abelha, plantação de sementes, pesca, e a
inevitável corrida das crianças atrás dos bichos de quintal. São
irrepreensíveis as rodas de música com sanfoneiros e violonistas da região,
algumas vezes acompanhadas por arrasta-pé (bailes típicos da roça), além de
contadores de histórias e causos pitorescos (lendas e estórias do povo local)
com o irrepreensível sotaque do nosso mais puro caipira.
5. EXPERIÊNCIAS VERÍDICAS
O aprendizado veio com as tentativas e
erros. Laélio Bianchini da Costa Ávila, dono da Fazenda do Barreiro, a primeira
a receber hóspedes para dormir, foi descobrindo aos poucos os interesses dos
turistas. Além de pratos típicos preparados no fogão à lenha e das cavalgadas,
a fazenda oferece caminhadas por trilhas ecológicas, pescaria em rios e açudes
e descida de bote pelo Rio da Divisa, que corta a propriedade. A alta
temporada, concentrada nos meses de inverno, tem começado de uns anos para cá a
se estender pelas férias de verão, quando as temperaturas amenas tornam mais
agradáveis os passeios ao ar livre e permitem até banhos de cachoeira.
"Durante um ano inteiro, hospedamos 4 mil pessoas. Somando os que vêm
apenas passar o dia na fazenda, dá o total de 9 mil visitantes", diz Laélio.
A Fazenda do
Barreiro, de 1782, começou a hospedar em 1987 e hoje tem 23 apartamentos com
capacidade para até 80 turistas. Como outras propriedades de turismo rural da
região, também têm estrutura para receber grupos de empresas para convenção,
seminário ou reunião de trabalho. Nos 1.500 hectares da fazenda, são criadas
600 cabeças de gado de corte, 100 de ovelhas para consumo próprio e 80 cavalos.
"Hoje, 80% do rendimento econômico da propriedade vêm do turismo
rural", revela Laélio. Na sua observação, tudo chama a atenção do turista,
desde a água mineral que sai direto das torneiras até a liberdade de poder
deixar as portas destrancadas, sem nenhuma preocupação com segurança.
Mesmo sendo os
primeiros a entrar na atividade do turismo rural, os fazendeiros lageanos ainda
enfrentam desafios para decifrar os interesses dos visitantes e encontrar
maneiras de satisfazê-los. "Na fazenda, 60% do tempo de trabalho da
telefonista que faz as reservas são gastos dando explicações sobre como
funciona o turismo rural aqui, o que tem na propriedade, se o quarto é chalé,
se tem cobertor, televisão...", conta o economista Rogério Lebarbenchon
Silveira, da Fazenda Boqueirão. Dúvidas que parecem banais, mas reveladoras da
dificuldade que têm turistas, proprietários rurais e estudiosos do assunto em
definir a complexidade do que é o turismo rural. A Embratur, ao elaborar o
Manual Operacional do Turismo Rural, diz que esse turismo se realiza no meio
ambiente, fora de áreas intensamente urbanizadas, e caracteriza-se por empresas
de pequeno porte, que têm no uso da terra a atividade econômica predominante,
voltada para práticas agrícolas e pecuárias. É uma maneira de diferenciá-lo do
ecoturismo, centrado na conservação dos ecossistemas, educação ambiental e
proteção da paisagem, e de outros serviços que se desenvolvem no campo, como
hotéis cinco-estrelas, centros de convenções, parques naturais para práticas
esportivas, clínicas de saúde, ou seja, atividades apenas localizadas
geograficamente em zonas rurais.
No entanto, uma vez
que a agropecuária sozinha já não gera renda e empregos suficientes para a
ocupação da população rural, tanto o turismo como estes novos empreendimentos
ganham bastante peso econômico. São algumas das "novas funções
não-agrícolas" do campo, como define o professor José Graziano da Silva,
do Instituto de Economia da Unicamp, em Campinas, SP. "É que as áreas
rurais vêm sendo crescentemente associadas não apenas com as atividades
relacionadas à produção, mas também com aquelas orientadas para o consumo, como
lazer e turismo", explica o professor, coordenador do Projeto Rurbano, que
discute o processo atual de diluição das fronteiras geográfica, cultural e
tecnológica entre o rural e o urbano. Com a multifuncionalização das
propriedades e do próprio meio rural, fica cada vez mais difícil definir o
turismo rural, atividade aberta que possibilita às pessoas maior contato com o
ambiente rural, os bens da natureza, os costumes locais, a cultura regional
sobre música, culinária e arquitetura, fabricação caseira de alimentos, artesanato
típico, objetos da casa e do trabalho de outros tempos históricos, resgate das
festas populares regionais e revitalização de muitas outras práticas
tradicionais — em Lages, a Festa Nacional do Pinhão já faz parte da história do
município.
Mais do que uma
questão conceitual, essa discussão aponta, na opinião de Rogério, da Fazenda
Boqueirão, para a urgência em regulamentar e normatizar a atividade: "O
turismo rural hoje não é reconhecido como do ramo da hotelaria nem como
trabalho rural. Além disso, a legislação brasileira não contempla a atividade
‘serviços’ no meio rural". Em sua propriedade, com 3 mil cabeças de gado,
são 16 empregados contratados, dois diaristas, e ainda gaiteiros que tocam
música típica na hora do almoço, coisa comum na região. Os fazendeiros reclamam
que está sendo exigida a legalização destes músicos e levantam ainda o problema
da inadequação da legislação sanitária, que impede o dono da fazenda de servir
carne abatida na propriedade, seja de boi, ovelha ou frango, e ainda exige a
contratação de um químico como responsável pela qualidade da água da piscina
aberta aos hóspedes ou de um veterinário que responda pelo leite servido.
Para Idenio Azuil
Vieira, da Fazenda Dourado, uma das últimas a entrar no circuito do turismo
rural em Lages, não foi difícil evitar erros cometidos pelos pioneiros no que
diz respeito à infraestrutura e ao conforto, mas até hoje a qualificação de
mão-de-obra ainda é um problema. "Os bons profissionais não querem morar
na fazenda, e os gastos com o transporte diário para a cidade inviabilizam um
acordo", diz Idenio, que conta principalmente com a ajuda da mulher e de
dois filhos. Do seu faturamento, 60% vêm do turismo, e o restante, da pecuária
de corte, com 150 cabeças. Na propriedade de 223 hectares, a família ainda tem
para consumo interno o cultivo de milho e feijão, a horta, o pomar e a produção
de leite. Para minimizar este problema da mão-de-obra, está sendo criado em
Lages o primeiro curso de Turismo Rural e Hotelaria do país, ainda em processo
de aprovação pelo MEC — Ministério de Educação e Cultura. É que o crescimento
da atividade, não só em Lages, mas também em outros polos de turismo rural no
país, tem imposto aos proprietários o desafio de combinar profissionalismo com
atendimento familiar e informal. Dar conforto sem perder a rusticidade que
seduz o cidadão urbano no contato com as coisas do campo.
Uma verdadeira
imersão na rotina de uma autêntica fazenda, com direito a passeios a cavalo e
caminhadas pela paisagem bucólica. É isso que o Engenho Cordeiro, funcionando
atualmente como produtor de gado nelore, promete aos seus hóspedes.
Sua localização, a apenas 60 km do Recife,
por estradas asfaltadas, é uma de suas facilidades. As atrações da propriedade
se espalham pelos seus 600 hectares. São açudes, currais, criações de ovelhas e
cavalos que costumam fazer a festa de quem está acostumado ao dia-a-dia dos
grandes centros urbanos.
Como a fazenda está
em plena atividade, o turista pode participar de todas as suas tarefas usuais,
como ordenhas, colheitas e marcações do gado. Quinze famílias de empregados,
além dos proprietários, moram no engenho. À noite, é possível assistir às
cantorias e ouvir as histórias do folclore local.
Os visitantes,
segundo rezam as tradições do interior, são tratados como familiares, e
hospedados na própria casa-sede. São apenas 5 suítes, o que garante o clima
intimista do hotel fazenda. Nos pacotes oferecidos, estão incluídas as
refeições - com pratos da culinária regional -, e o acesso a todas as
atividades oferecidas.
O turista ainda
pode aproveitar a piscina da fazenda, ou os três quilômetros de rio que cortam
suas terras. Para quem prefere descansar, as redes nos alpendres são
imperdíveis, e o silêncio do lugar, pontuado pelo canto dos passarinhos, ajuda
o visitante a esquecer o resto do mundo.
Nem só de litoral
vive o turismo pernambucano. Em um Estado de vocação iminentemente agrária, não
é de se estranhar que outro ramo do turismo venha conquistando espaço entre as
pessoas que querem - e muitas vezes precisam - se distanciar um pouco do
estresse das grandes cidades.
Estamos falando do
turismo rural, em que os visitantes podem participar ativamente da tradicional
vida no campo. Não dentro de um hotel-fazenda (que simula essa realidade), mas
nas dependências de uma autêntica fazenda de gado ou de um secular engenho de
cana-de-açúcar.
Na Zona da Mata, no
Agreste ou até mesmo no Sertão é possível encontrar fazendas e engenhos que,
literalmente, abriram suas porteiras para receber os turistas. Nestes locais, é
possível fazer caminhadas ecológicas, andar a cavalo, pescar em açudes, tomar
banho de bica ou, simplesmente, descansar.
A alimentação é
outra atração à parte: o leite é servido ainda no curral; as frutas e verduras,
colhidas no pé; e, no final da tarde, é servido o tradicional caldo de cana.
Uma das pioneiras é a Fazenda Sambaíba, em Brejão (Agreste Meridional, a 250 km
de Recife), onde os hóspedes se alojam em apartamentos de duas a quatro
pessoas.
No mesmo município
fica Colônia da Serra, que oferece quartos amplos, na casa grande da fazenda e
diárias que incluem diversas atividades de lazer com cavalos e gado. Já a
Fazenda Brejo, em Saloá (Agreste Meridional, a 270 km do Recife), a hospedagem
pode ser em apartamentos ou alojamentos. Com cachoeira natural e piscina, a propriedade
também oferece atividades de lazer, como cavalgadas e caminhadas. Além de um
manancial de Mata Atlântica onde são criados gatos do mato, macacos e outros
animais silvestres.
Também próximo à
capital pernambucana fica o Engenho Santa Fé, em Nazaré da Mata (Mata Norte, a
74 km do Recife). Além de dispor de apartamentos para casal, o local oferece
também um pesque-pague para visitantes que não estejam hospedados. Mais uma
atração do local é um museu com peças do engenho desativado que funcionou no local.
Outra opção é a
fazenda Engenho Cordeiro, em Carpina (Mata Norte, distante 56 km da capital).
Por lá, o dia-a-dia começa às 6h com a ordenha no curral e continua com
cavalgadas, pescaria, montaria e outras atividades agrícolas. A fazenda, com
600 hectares, tem rebanhos de cabras, ovelhas e gado, além de cavalos para
montaria.
Na fazenda moram 15
famílias de trabalhadores. As refeições são feitas aproveitando a produção do
local - leite, queijos, frutas, doces e outros. O cardápio prioriza as comidas regionais
como mungunzá, arroz-doce, cuscuz, feijoada, buchada. Apesar da construção da
casa do engenho ser da década de 50, o resto do conjunto arquitetônico é de
1867 com características típicas do Brasil Colonial.
O desempenho
ambiental desta atividade, nas diferentes dimensões avaliadas, pode ser
observado na figura abaixo. A dimensão Ecologia da Paisagem apresentou um
desempenho desfavorável para a atividade, indicando a necessidade de
intervenção e melhoria de práticas conservacionistas e de recomposição de
habitats. Os excelentes resultados relativos aos indicadores econômicos e a
conservação da qualidade de água forma os aspectos favoráveis ao desempenho
ambiental do agroturismo na Região.
Comentários
Postar um comentário